53 • Conjuntura Internacional • Belo Horizonte, ISSN 1809-6182, v.17 n.1, p.52 - 54, mai. 2020
O segundo bloco de artigos intitulado jus-
tamente Guerra e ética, é apresentado como o
epicentro do livro de acordo com o organizador
da obra. Nele apresentam-se textos dedicados a
examinar a relação entre guerra, paz e justiça, e
a possibilidade de constituição de uma ordem
internacional e jurídica ética, capaz de ordenar
as relações entre distintos povos que profes-
sam diferentes preceitos éticos. Em Dialética
da guerra e da paz escrito por José Luís Fiori
analisa-se detidamente a gênese do sistema in-
ternacional como derivada das guerras, cuja
pilhagem sob a forma de tributação punitiva
imposta pelos vencedores aos vencidos lançou
as bases para a formação embrionária da hierar-
quia de forças entre as nações. Assim, o sistema
internacional emerge de um desenvolvimento
expansivo marcado pela necessidade de resol-
ver o problema do financiamento da guerra,
transformando o ato de guerrear em um ins-
trumento fundamental do enriquecimento e da
acumulação de poder. Essa natureza da guer-
ra a faria ser a peça sistêmica da expansão do
próprio capitalismo, sendo crucial para o de-
senvolvimento do sistema interestatal dentro e
fora da Europa, até finalmente se universalizar
no século XX com a globalização adquirindo
diferentes faces e argumentações éticas. Assim,
é sob a égide da hegemonia estadunidense que
se dá sucessão de formas do sistema interna-
cional, abarcando as guerras humanitárias do
final dos anos 1990, posteriormente substituí-
das pela “guerra ao terror”, que de certa forma
vigoram até o século XXI. A cada uma dessas
formas de guerra corresponde uma determina-
da “ética”. Assim, a distinção entre os conceitos
de “ética” e “justiça” assume na análise de Fiori
não só um sentido filosófico, mas atua como
um signo disruptivo, visto que a Guerra do
Golfo operou-se em meio ao reordenamento
do sistema internacional, em um processo mo-
tivado por raízes muito mais profundas que os
objetivos declarados pelos Estados Unidos. Em
verdade, como Fiori bem indica, a Guerra do
Golfo de 1991 conflui com uma transformação
de grande magnitude no sistema internacional,
traduzido no fim da Guerra Fria, e na ascensão
de um momento que distintos autores e ana-
listas caracterizaram como dominação unipolar
estadunidense.
Já em Guerra e ética em Aristóteles há um
debate crítico travado a partir das lacunas
deixadas tanto pelos realistas como pelos
liberais sobre a ética das guerras, que o artigo
busca preencher propondo um diálogo entre a
perspectiva das guerras justas e o pensamento
clássico aristotélico. Guerra, virtù e ética em
Maquiavel retoma as grandes transformações
presentes no sistema internacional contem-
porâneo ao filósofo florentino que marcam a
disseminação das guerras como formadoras do
ordenamento interestatal. Já em Guerra e li-
berdade em Mill, Kant e Hegel apresenta-se um
diálogo entre as visões otimistas europeias con-
tidas no liberalismo clássico dos dois primeiros
autores, e um contraponto com a percepção
hegeliana sobre a guerra. Em Guerra e violência
na teoria marxista oferece uma análise dos escri-
tos de Marx e Engels sobre o militarismo, en-
tendido como expressão das contradições que
emanam do poder da classe dominante. Guerra
e moral internacional em Carr, Aron e Morgen-
thau traz um exame das distinções e pontos
comuns entre os autores citados no tema da
ética da guerra. Por fim, Guerras humanitárias
e ordem ética analisa o declínio do humanismo
liberal durante os governos de Barack Obama.
Já o terceiro conjunto de artigos dedica-
-se ao exame dos principais debates teóricos
sobre a geopolítica, geoeconomia e a dinâmica