
4 • Conjuntura Internacional • Belo Horizonte, ISSN 1809-6182, v.18 n.1, p.2 - 5, mai. 2021
que é vista pelo ocidente como evidência do
expansionismo chinês, é identicada pelo go-
verno comunista sob a ótica de uma correção
histórica de uma herança imperialista japonesa
e europeia. Da mesma forma, Mahbubani vê
que a ação chinesa no Mar do Sul da China é
reativa, fruto de uma percepção de ameaça pela
incursão da marinha estadunidense na região e
da corrida por reclamação de terras iniciada por
países vizinhos.
Sobre potencial transição para um sistema
democrático, Mahbubani oferece, no Capítulo
6, uma visão diferente do mainstream ocidental.
Tendo uma opinião positiva a respeito do atual
líder chinês, Xi Jinping, o autor expõe que uma
China estável e dinâmica economicamente
contribui para o desenvolvimento socioeconô-
mico do seu povo, como também produz bens
públicos globais. Se a China se democratizasse
de forma abrupta, como queriam os ocidentais
ao investirem na estratégia de abertura econô-
mica chinesa, mais provável seria a ascensão de
lideranças nacionalistas raivosas, com tendên-
cias imperialistas, como o é Donald Trump nos
EUA, do que líderes pragmáticos. Uma demo-
cracia chinesa, além disso, estaria pouco apta a
contribuir para com desaos globais, haja vista
o potencial nacionalista e introvertido de sua
sociedade. Ao contrário, a governança respon-
sável da China se reproduz na resposta a esses
desaos globais, como a mudança climática, já
que a China comunista de hoje emerge como
uma “potência do status quo”, e não uma “po-
tência revolucionária”. Para o autor, os diversos
dilemas do autoritarismo chinês não impedi-
ram o crescimento econômico, a ascensão de
um sistema público meritocrático e competen-
te, e o surgimento de novas classes, que irão,
cada vez mais, pressionar o governo comunista
por mais voz. Uma transição a um futuro sis-
tema democrático, portanto, virá de dentro e
terá características distintas de uma democracia
liberal.
Kishore Mahbubani questiona: sendo o
objetivo primordial dos EUA manter sua pri-
mazia no mundo e conter a China, não seria
contra os interesses nacionais dos EUA promo-
ver a democracia na China, já que a democra-
cia é, em tese, um motor do desenvolvimento?
Diversos exemplos desde a Primavera Árabe
mostram que uma democracia imposta de fora
produz o caos. Não seria esse o real interesse
dos EUA? Com isso, Mahbubani difere reais
interesses nacionais com propaganda política,
que é comum a ambos os lados. Fornece, as-
sim, ideias interessantes para um debate ainda
muito enviesado. Ao questionar assunções ti-
das como verdades pelos ocidentais, demons-
tra que ainda lhes falta um entendimento mais
aprofundado sobre a Ásia em geral e a China
em particular. Has China Won? Tem foco, por-
tanto, na falta de entendimento entre China
e EUA, e Mahbubani aborda apenas tangen-
cialmente, no Capítulo 8, as relações da China
com a Ásia, a Europa e a África, sequer mencio-
nando a América Latina. Para ele, cada região
abordará a ascensão chinesa de forma diferente,
mas cada uma irá contrabalançar as realidades
geopolíticas da ascensão chinesa, evitando to-
mar decisões ideológicas e alianças automáticas
como acontecera na Guerra Fria. Dando me-
nos atenção a essas regiões, o autor simplica,
assim, futuras transformações sistêmicas aos
movimentos estratégicos das duas maiores po-
tências do século, mesmo que talvez sejam estes
o ponto nevrálgico para se compreender a evo-
lução do sistema internacional no século XXI.
Sua conclusão paradoxal, contida no Ca-
pítulo 9, é a de que o conito entre os EUA e a
China é, ao mesmo tempo, inevitável e contor-