
53 • Conjuntura Internacional • Belo Horizonte, ISSN 1809-6182, v.19 n.3, p.52 - 53, out. 2022
moral; possibilidade de agressão planejada den-
tro da lógica de não violência; igualdade como
elemento central. Primeiro, ela discorre sobre a
ideia de que seres humanos são seres relacionais
e sociais, que necessitam da coletividade para
seu desenvolvimento e sobrevivência material,
criando um ambiente de interdependência. De-
vido ao fato de que a noção de individualidade
é um elemento essencial para a lógica capitalis-
ta, ela faz com que os indivíduos desviem-se da
necessidade da ação em prol do coletivo, o que
geraria consequências à sociedade.
O segundo ponto está na diferenciação
entre questões morais e éticas. O destaque do
livro está na defesa de que a não-violência pou-
co tem a ver com moralidade, mas com uma
ética societal que explica suas intenções e parâ-
metros. Tratando dentro de uma lógica moral,
haveriam dois argumentos centrais: a preserva-
ção da vida e não destruir vidas. Porém, não
poderia estar mais longe da lógica proposta: a
não violência está na tentativa de eliminar da
sociedade práticas e preconceitos que levam à
perda da empatia pelos outros.
Ao tratar acerca de agressão planejada, a
autora defende que a fúria pode ser direciona-
da ao perpetrador desde que sob a condição de
não produzir ódio da mesma natureza ao qual
se opõe. Não se trata do impedimento do uso
da força, mas da defesa que seja feito de forma
a impedir a criação de um ciclo de ódio.
Por m, há a reexão acerca do luto e
quais vidas são merecedoras. Preconceitos
como racismo, misoginia, homofobia, xeno-
fobia, dentre outros, precisam ser combatidos
em sua raiz, já que violência é discriminatória e
toda vida importa.
Em e Force of Non-Violence, Judith
Butler traz uma grande contribuição para se
pensar vulnerabilidade, violência, resistên-
cia política e ética, trazendo para o campo da
política e da losoa uma reexão sobre a re-
núncia do individualismo enquanto forma de
resistência ao racismo e à violência sistêmica.
É um livro publicado em momento histórico
oportuno, que convida à reexão a partir da
ótica do indivíduo e do discurso. Entretanto há
questionamentos que podem ser levantados da
construção da argumentação.
Apesar de não ser a primeira teórica a tra-
tar da questão da não-violência, o livro falha
ao não trabalhar como atos não-violentos são
percebidos como violentos pelo Estado, seja a
partir da ótica da moralidade, segurança ou na-
cionalismo, o que leva à legitimação do uso do
poder estatal como resposta. Um exemplo des-
sa dinâmica, apesar de posterior à construção
do livro, é o diferente tratamento dado pelo go-
verno estadunidense às manifestações do movi-
mento Black Lives Matter em 2020 e aos pro-
testos contrários à derrota de Donald Trump
ocorridos no Capitólio no início de 2021.
Outra questão aqui levantada é que a au-
tora não examina em quais condições práticas
não-violentas desaam estruturas de poder.
Isso poderia ser feito através da análise de como
essas práticas são aplicados em movimentos so-
ciais e contra hegemônicos. Por m, questiona-
-se, o emprego de conceitos como “igualitaris-
mo radical”, que carece de aprofundamento no
texto; assim como a forma contraditória esco-
lhida para tratar sobre solidariedade, falhando
em posicionar tal debate teoricamente.
REFERÊNCIAS
BUTLER, Judith. e Force of Non-Vio-
lence: An Ethico-Political Bind. Londres: Ver-
so Books, 2020. ISBN: 9781788732765