The Force of Non-Violence: não violência
e resistência política por Judith Butler
Ana Luiza Braga Eliziário1
DOI: 10.5752/P.1809-6182.2022v19n3p52-53
Recebido em: 29 de abril de 2021
Aprovado em: 28 de junho de 2021
1 Doutoranda em Sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais, bolsista FAPEMIG. Mestra em Relações Internacionais
pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Contato: ana.eliziario@sga.pucminas.br.
Artigo
52 • Conjuntura Internacional • Belo Horizonte,
ISSN 1809-6182, v.19 n.3, p.52 - 53, out. 2022
O presente texto propõe-se trazer uma
resenha crítica do livro “e Force of Non-
-Violence: An Ethico-Political Bind” (ISBN
9781788732765) de Judith Butler, publicado
em Londres pela Verso Books em 04 de fevereiro
de 2020. Butler inicia em busca de uma denição
para violência e não-violência, chegando à con-
clusão de que são termos extremamente disputa-
dos, apresentando diferentes denições atreladas.
A diculdade está no fato de que deni-
ções instrumentais apresentam interesses polí-
ticos, servindo, até mesmo, à violência em si,
pois encontram-se cerceadas por debates polí-
ticos e morais. Assim, propõe que uma análise
ética deve estabelecer-se crítica do individualis-
mo como base da política e da ética, conside-
rando como os selves implicam sobre as vidas
dos outros, a partir de um conjunto de relações
que podem ser destrutivas ou apoio.
Outro fator levantado está nas diferentes
formas que a violência é interpretada, social-
mente, discursivamente, e através de percep-
ções com o Estado como detentor do direito
do uso da força, permitindo a criação de perso-
nagens performativos. O exemplo trazido está
na opressão e violência física contra pessoas não
brancas nos Estados Unidos perpetrada por
agentes do Estado.
Apesar de levar em conta a argumentação
de que violência deveria ser utilizada como táti-
ca devido ao seu poder de inuenciar transfor-
mações sociais e econômicas, defende que seria
uma forma de negligência às dimensões éticas e
normativas. Mesmo frequentemente lida como
uma prática não realista ou ingênua perante à
hegemonia e subjugação, a não violência deve-
ria ser vista como técnica de resistência às de-
sigualdades, garantia de solidariedade e arma-
ção de um igualitarismo radical.
Autopreservação e autodefesa, justicati-
vas comuns para contra-violência e violência,
trazem dois efeitos signicativos: um ciclo con-
tínuo de violência; e a noção de autodefesa le-
gitimando diferentes personicações do self, in-
cluindo nação, cultura, regime, ou, até mesmo,
branquitude. Logo, sua lógica de não-violência
assertiva e ativa traz uma crítica radical da indi-
vidualidade, tal como a crença no valor igual de
todas as vidas e seu direito ao luto.
Pode-se dividir o argumento trazido pelo
livro em quatro argumentos menores: a necessi-
dade de sociabilidade humana; questões éticas x
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moral; possibilidade de agressão planejada den-
tro da lógica de não violência; igualdade como
elemento central. Primeiro, ela discorre sobre a
ideia de que seres humanos são seres relacionais
e sociais, que necessitam da coletividade para
seu desenvolvimento e sobrevivência material,
criando um ambiente de interdependência. De-
vido ao fato de que a noção de individualidade
é um elemento essencial para a lógica capitalis-
ta, ela faz com que os indivíduos desviem-se da
necessidade da ação em prol do coletivo, o que
geraria consequências à sociedade.
O segundo ponto está na diferenciação
entre questões morais e éticas. O destaque do
livro está na defesa de que a não-violência pou-
co tem a ver com moralidade, mas com uma
ética societal que explica suas intenções e parâ-
metros. Tratando dentro de uma lógica moral,
haveriam dois argumentos centrais: a preserva-
ção da vida e não destruir vidas. Porém, não
poderia estar mais longe da lógica proposta: a
não violência está na tentativa de eliminar da
sociedade práticas e preconceitos que levam à
perda da empatia pelos outros.
Ao tratar acerca de agressão planejada, a
autora defende que a fúria pode ser direciona-
da ao perpetrador desde que sob a condição de
não produzir ódio da mesma natureza ao qual
se opõe. Não se trata do impedimento do uso
da força, mas da defesa que seja feito de forma
a impedir a criação de um ciclo de ódio.
Por m, há a reexão acerca do luto e
quais vidas são merecedoras. Preconceitos
como racismo, misoginia, homofobia, xeno-
fobia, dentre outros, precisam ser combatidos
em sua raiz, já que violência é discriminatória e
toda vida importa.
Em e Force of Non-Violence, Judith
Butler traz uma grande contribuição para se
pensar vulnerabilidade, violência, resistên-
cia política e ética, trazendo para o campo da
política e da losoa uma reexão sobre a re-
núncia do individualismo enquanto forma de
resistência ao racismo e à violência sistêmica.
É um livro publicado em momento histórico
oportuno, que convida à reexão a partir da
ótica do indivíduo e do discurso. Entretanto há
questionamentos que podem ser levantados da
construção da argumentação.
Apesar de não ser a primeira teórica a tra-
tar da questão da não-violência, o livro falha
ao não trabalhar como atos não-violentos são
percebidos como violentos pelo Estado, seja a
partir da ótica da moralidade, segurança ou na-
cionalismo, o que leva à legitimação do uso do
poder estatal como resposta. Um exemplo des-
sa dinâmica, apesar de posterior à construção
do livro, é o diferente tratamento dado pelo go-
verno estadunidense às manifestações do movi-
mento Black Lives Matter em 2020 e aos pro-
testos contrários à derrota de Donald Trump
ocorridos no Capitólio no início de 2021.
Outra questão aqui levantada é que a au-
tora não examina em quais condições práticas
não-violentas desaam estruturas de poder.
Isso poderia ser feito através da análise de como
essas práticas são aplicados em movimentos so-
ciais e contra hegemônicos. Por m, questiona-
-se, o emprego de conceitos como “igualitaris-
mo radical”, que carece de aprofundamento no
texto; assim como a forma contraditória esco-
lhida para tratar sobre solidariedade, falhando
em posicionar tal debate teoricamente.
REFERÊNCIAS
BUTLER, Judith. e Force of Non-Vio-
lence: An Ethico-Political Bind. Londres: Ver-
so Books, 2020. ISBN: 9781788732765