Embargo Econômico Enquanto Instrumento
de Política Externa Estadunidense: O Caso
da Venezuela Contemporânea
Economic Embargo as an Instrument of us Foreign Policy: the Case of Contemporary
Venezuela
El Embargo Económico momo Instrumento de la Política Exterior Estadounidense: el
Caso de la Venezuela Contemporánea
Lucas Edgardo Pordeus Leon1
Pedro Henrique de Moraes Cicero2
Recebido em: 29/06/2022
Aprovado em: 04/12/2023
DOI: 10.5752/P.1809-6182.2022v19n1p74-81
Resumo:
O artigo examina a consolidação do embargo econômico imposto pelos EUA à Venezuela
enquanto instrumento de política externa em resposta ao crescimento da multilateralidade
no hemisfério vis a vis a ascensão chinesa. Analisam-se os impactos do embargo na
economia venezuelana e sua exibilização a partir da guerra na Ucrânia.
Palavras-Chave: Relações EUA/Venezuela, Bloqueio Econômico, Política Externa
Abstract:
e article examines the economic embargo imposed by the USA on Venezuela as an
instrument of foreign policy in response to the growth of multilateralism in the hemisphere
vis-à-vis the rise of China. e impacts of the embargo on the Venezuelan economy and its
easing following the war in Ukraine are scrutinized.
Keywords: US/Venezuela Relations, Economic Embargo, Foreign policy
Resumen:
El artículo examina el embargo económico impuesto por Estados Unidos a Venezuela
como instrumento de política exterior en respuesta al crecimiento del multilateralismo
en el hemisferio frente al ascenso de China. Se analizan los impactos del embargo en la
economía venezolana y su exibilización tras la guerra en Ucrania.
Palabras-Claves: Relaciones EEUU/Venezuela, Embargo Económico, Política Externa
1 Graduado em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade de Brasília (UnB); e mestre em Ciências Sociais pelo Programa
de Pós-Graduação em Ciências Sociais – Estudo Comparados sobre as Américas (PPGECsA) do Departamento de Estudos Lati-
no-Americanos (ELA) da UnB. Contato: lucaspleon@gmail.com.
2 Mestre e doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas; professor de Relações Internacionais no Instituto
de Economia e Relações Internacionais (PPGRI) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU); e professor colaborador do Pro-
grama de Pós-Graduação em Ciências Sociais – Estudos Comparados sobre as Américas (PPGECsA) da Universidade de Brasília
(UnB). Contato: pedrohenrique@ufu.br.
Artigo
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INTRODUÇÃO
Este artigo, apoiando-se em fontes pri-
márias e em agendas de pesquisa especializa-
das, analisa a recente consolidação do embar-
go econômico liderado pelos Estados Unidos
da América (EUA) contra a Venezuela. O ar-
gumento centra-se na hipótese de que a ação
compõe parte da estratégia da política externa
estadunidense, com objetivo de combater a ex-
pansão da multipolaridade no hemisfério, em
especial, devido ao aumento da inuência da
China na região.
Para tanto, na primeira seção, discorre-se
sobre os dispositivos legais estabelecidos com
vistas a instituir o bloqueio econômico para,
então, apontar como o embargo contribuiu de-
cisivamente para dilapidar as estruturas econô-
micas do país sul-americano ao reduzir sobre-
maneira a captação de seus recursos petroleiros,
o principal ativo econômico da Venezuela. Na
segunda seção, abordam-se os motivos que jus-
ticaram a adoção dessa contundente estraté-
gia de política externa, analisando-se a maneira
pela qual ela se perpetuou ao longo de três ad-
ministrações presidenciais em Washington. Por
m, discorre-se sobre a exibilização do embar-
go iniciada após a guerra na Ucrânia.
O EMBARGO
A norma que abriu margem para a conso-
lidação do embargo estadunidense contra a Ve-
nezuela foi a Lei 113-278, intitulada “Venezue-
la Defense of Human Rights and Civil Society Act
of 2014”. O dispositivo autoriza o Presidente
dos EUA a impor sanções contra a Venezuela3.
Sancionada em dezembro de 2014, o instru-
3 Disponível em https://www.congress.gov/bill/113th-con-
gress/senate-bill/2142.
mento legal foi aprovado no Congresso com
amplo apoio, tanto de Democratas quanto de
Republicanos.
A Lei rmou-se enquanto resposta de
Washington às reverberações decorrentes dos
acontecimentos conhecidos como “La Salida”,
a onda de protestos liderada pela oposição ve-
nezuelana contra o governo do Presidente Ni-
colás Maduro. Iniciadas em fevereiro de 2014,
as manifestações objetivavam a deposição de
Maduro e resultaram em, ao menos, 43 mor-
tes4. Entre as vítimas estavam opositores, sim-
patizantes chavistas, policiais e transeuntes não
diretamente envolvidos nos protestos5.
A promulgação da referida Lei inaugurou,
pois, uma nova fase da política externa dos
EUA em relação à Venezuela. Consolidou-se,
assim, uma postura proativa, visando aberta-
mente a deposição de Maduro. Três meses após
a sanção da Lei, o Presidente Barack Obama
emitiu a Ordem Executiva 13.692, decretando
emergência nacional” nos EUA ao reconhecer
o país caribenho como uma ameaça “incomum
e extraordináriaà segurança estadunidense6.
Na prática, a decisão conferiu a Venezuela tra-
tamento semelhante ao dispensado aos princi-
pais opositores de Washington (Irã, Síria, Cuba
e Coreia do Norte).
Desde então, a Venezuela e seus cidadãos
foram alvo de, ao menos, 506 atos de sanção
econômicas, os quais resultaram em diferentes
consequências práticas (Telesur, 2021). Para
efeito de compreensão, podemos diferenciá-las
entre as individuais, direcionadas a pessoas fí-
sicas e suas empresas; as nanceiras, que afe-
4 Conforme noticiado em https://brasil.elpais.com/bra-
sil/2014/02/21/internacional/1392951445_782523.html
5 Conforme registrado em https://venezuelanalysis.com/
analysis/11211; e https://twitter.com/victimaguarimba.
6 Documento disponível em https://www.govinfo.gov/con-
tent/pkg/FR-2015-03-11/pdf/2015-05677.pdf.
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tam as capacidades de nanciamento do país e
das empresas de determinado setor econômico,
em especial as ligadas à cadeia produtiva do pe-
tróleo; as comerciais, que bloqueiam o comér-
cio de bens e serviços especícos e, por m, as
secundárias, que atingem a empresas e pessoas
de países que são parceiros comerciais na nação
embargada. Cumpre salientar que, até agosto
de 2017, os EUA aplicaram apenas sanções in-
dividuais que, sem efeitos importantes sobre a
economia nacional, afetaram exclusivamente
pessoas vinculadas ao governo Maduro (Leon,
2022).
Por sua vez, uma nova fase do bloqueio
imposto a partir de agosto de 2017, já durante
a administração do Republicano Donald
Trump, afetou estruturalmente a economia
venezuelana ao proibir o acesso ao mercado
nanceiro estadunidense da Petróleos de Vene-
zuela S.A. (PdVSA), do governo da Venezue-
la e do Banco Central da Venezuela (BCV) 7.
Além disso, Washington colocou sob suspeita
todas as transações monetárias vinculadas à
Venezuela, ocasionando o bloqueio de canais
nanceiros com instituições de outras nações,
além de congelar ativos do país no exterior,
medida também adotada pelo Reino Unido e
Portugal. Proibiu-se, ainda, o pagamento dos
dividendos ao governo venezuelano provenien-
tes da empresa Citgo, principal lial da PdVSA
no exterior (Leon, 2022).
Após a aplicação da primeira Medida
Coercitiva Unilateral (MCU) direcionada ao
setor nanceiro, a velocidade da retração da
produção petroleira na Venezuela triplicou.
Em um contexto em que, no ano de 2012, o
comércio de hidrocarbonetos foi responsável
7 Mais detalhes da medida disponível em https://home.trea-
sury.gov/system/les/126/13808.pdf.
por 96% das divisas que ingressaram no país8, o
embargo imprimiu perdas signicativas à eco-
nomia venezuelana. De uma retração do setor
petrolífero de 11,5% experimentada em 2017,
o índice de retração aumentou para 30,1% em
2018. A diferença implicou na perda de US$
8,4 bilhões em divisas, também necessárias
para a manutenção das importações do país
(Weisbrot; Sachs, 2019).
A retração das exportações petrolíferas,
no caso da Venezuela, tem fortes implicações
porque um dos principais “efeitos colaterais
do rentismo que caracteriza a economia local
é a necessidade de importações de produtos de
consumo básico. Isso ocorre, pois os petrodó-
lares fazem com que seja comercialmente mais
vantajosa a importação desses produtos do que
a sua produção interna. Em 2018, os venezue-
lanos importaram 75% dos alimentos que con-
sumiram, assim como 90% dos insumos para
produção de remédios (Oliveiros, 2020).
A partir de novembro de 2018, o bloqueio
assumiu caráter ainda mais incisivo, ao proibir
o comércio de ouro9, petróleo10 e demais mi-
nerais11. A última medida imposta pelos EUA
nesse contexto foi a suspensão, em outubro de
2020, da permissão de trocar petróleo cru por
diesel12, o que ocasionou o m desse tipo de
permuta com companhias europeias e asiáti-
cas13. Após o embargo comercial, a produção
de barris de petróleo, que vinha de uma retra-
8 Dados disponíveis em http://www.bcv.org.ve/estadisticas/
balanza-de-pagos.
9 Mais detalhes sobre o embargo ao ouro em: https://www.go-
vinfo.gov/content/pkg/FR-2018-11-02/pdf/2018-24254.pdf
10 Documento disponível em: https://www.govinfo.gov/con-
tent/pkg/FR-2019-01-30/pdf/2019-00615.pdf
11 Mais detalhes da sanção à Minerven em: https://home.
treasury.gov/news/press-releases/sm631.
12 Conforme noticiado em https://www.reuters.com/article/
us-venezuela-oil-diesel-idUSKBN29N1VF
13 Conforme noticiado em https://www.reuters.com/article/
us-usa-venezuela-oil-sanctions-idUSKBN25R29Z.
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ção média de 3,1% ao mês, passou a cair, em
média, 4,8% ao mês nos 20 meses após o blo-
queio ao petróleo, que foi efetuado em janeiro
de 2019 (Oliveiros, 2020).
Ademais, para evitar a transferência do
comércio para outros países, os EUA impuse-
ram MCUs secundárias contra pessoas e em-
presas de diferentes nacionalidades. A de maior
impacto foi contra subsidiárias da Rosneft Oil
Company, em fevereiro de 2020. A empresa era
responsável pela compra, em meio ao embargo
comercial, de cerca de 80% do óleo produzido
na Venezuela, além de fornecer quase toda ga-
solina importada pelo país em 201914. Em con-
sequência, a companhia russa se viu obrigada
a abandonar suas transações na Venezuela pelo
temor dos acionistas15, causando severa escassez
de gasolina (Rodríguez, 2021).
Importante salientar que o bloqueio con-
tra a Venezuela não causou impactos relevantes
no mercado estadunidense, apesar da abrupta
ruptura nas importações de petróleo venezue-
lano (GAO, 2021). Isso graças ao boom do
fracking nos EUA que, desde meados dos anos
2000, resultou na expansão em larga escala de
sua produção de petróleo, óleo de xisto e gás
através do controverso e ultra poluente método
de extração por “faturamento hidráulico16”, o
qual fez a produção interna de hidrocarbone-
tos aumentar cerca de 250% entre os anos de
2008 e 201917, volume este que fez dos EUA
14 Sanções contra as empresas russas em: https://home.trea-
sury.gov/news/press-releases/sm909 e https://home.trea-
sury.gov/news/press-releases/sm937.
15 Conforme noticiado em https://www.washingtonpost.
com/world/europe/venezuela-maduro-russia-rosnef-
t/2020/03/28/0d38ce4a-7121-11ea-a156-0048b62c-
db51_story.html
16 O método consiste na perfuração de poços por meio da
fragmentação das rochas para extração de combustível lí-
quido ou gasoso que antes eram inacessíveis.
17 Conforme noticiado em https://www.eia.gov/energyex-
plained/oil-and-petroleum-products/imports-and-exports.
php
o maior produtor mundial do combustível em
2018 (Monaldi, 2018). Assim, o movimento
estratégico de busca da “autonomia energéti-
ca” permitiu que o embargo não interferisse na
economia estadunidense.
Por outro lado, o bloqueio causou danos
irreparáveis à Venezuela que, até 2018, teve nos
EUA o seu principal parceiro comercial. A si-
tuação econômica venezuelana se tornou ainda
mais calamitosa, pois o embargo ocorreu de
forma concomitante à maior queda nos preços
do petróleo na história – queda de 76% do va-
lor de comercialização entre 2014 a 2016 (Iyer;
Rodríguez, 2021). A soma desses dois aconteci-
mentos justica, em grande medida, a retração
de 98,6% no ingresso de moedas estrangeiras
na Venezuela, percebida entre 2013 e 2020
(Venezuela, 2021).
Assim, em contraposição à argumenta-
ção que aponta para a gestão “chavista” como
a causa única da atual crise venezuelana (FMI,
2022), o presente artigo entende que, apesar
de contribuir para a crise, a gestão bolivaria-
na não foi a única responsável, e, sim, fator la-
teral se comparado aos dois elementos acima
aventados. Apesar de não ter começado com
as sanções, a recessão que reduziu o Produto
Interno Bruto (PIB) venezuelano em 75%18,
entre 2013 e 2021, não pôde ser revertida
também porque, quando os preços do barril
apresentaram recuperação a partir de 2017,
os EUA aplicaram as primeiras MCUs contra
toda economia nacional, eliminando as pos-
sibilidades de recuperação do rentismo petro-
leiro venezuelano, modelo de crescimento que
prevalece no país sul-americano desde os anos
1920 (Leon, 2022).
18 Estimativa da CEPAL disponível em https://repositorio.
cepal.org/bitstream/handle/11362/47669/20/BP2021_
Venezuela_es.pdf.
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O EMBARGO ENQUANTO
ENFORCEMENT POLÍTICA
EXTERNA DOS EUA
O bloqueio contra a Venezuela represen-
tou o endurecimento da política externa dos
EUA contra o processo bolivariano, o qual
representou um contraponto à hegemonia es-
tadunidense na América Latina e Caribe. A es-
tratégia de inserção internacional do governo
Chávez consistiu, desde seu início, em se con-
trapor ao status quo regional e mundial. Tan-
to que, em visita à China, em 1999, Chávez
manifestou “descontentamento em relação à
ordem mundial unipolar regida pelos estadu-
nidenses, armando sua predisposição em unir
forças com Pequim para, com isso, auxiliar na
luta pela implementação de uma ordem mun-
dial multipolar” (Cicero, 2015, p. 161-162).
Diversas ações bolivarianas contribuíram
para cristalizar o antagonismo entre os países.
Destaca-se, nesse contexto, a defesa da inte-
gração latino-americana e caribenha a partir
dos acordos da Aliança Bolivariana dos Po-
vos da Nossa América (ALBA), consolidados
em 2004. Liderada pela Venezuela, a Aliança
buscou se contrapor à proposta estadunidense
de integração econômica territorial (ALCA),
representando “uma oposição ao avanço da
globalização neoliberal instituída desde a arti-
culação das propostas liberalizantes vinculadas
ao Consenso de Washington” (Cicero, 2015, p.
174-175).
Outra iniciativa bolivariana de impacto
foi o PetroCaribe, estabelecido em 2005, que
conferiu vantajosas condições para a compra
de petróleo às nações caribenhas, com consi-
deráveis descontos e parcelamentos a juros de
1% ao ano, representando importante apoio
econômico oferecido pela Venezuela. Para paí-
ses como Guiana, Jamaica e Nicarágua, o volu-
me de nanciamento obtido pelo PetroCaribe
equivaleu a aproximadamente 5% do PIB des-
sas nações (Cicero, 2015). Em 2017, ao desti-
nar US$ 2 milhões para iniciativas de seguran-
ça energética de países do Caribe, o Comitê do
Senado dos EUA justicou a ação pela busca
por “maior independência energética da Vene-
zuela”, indicando a preocupação de Washing-
ton com a inuência venezuelana19.
Contudo, a morte de Chávez e a vitória
apertada de seu sucessor nas eleições de 2013
ofereceram condições favoráveis para o forta-
lecimento da oposição ao bolivarianismo e,
consequentemente, aos projetos de integração
latino-americana nos moldes propostos por
Chávez. Somado a isso, tanto a queda de 76%
no valor do petróleo entre 2014 e 2016 que
levou a Venezuela a enfrentar uma grave crise
econômica quanto a conquista da maioria no
Legislativo pela oposição, em 2016, contribuí-
ram decisivamente para que a política do blo-
queio fosse levada às últimas consequências, ou
seja, a deposição de Maduro. Através do embar-
go, Washington fez uso de estratégia de políti-
ca externa semelhante à adotada contra outros
países também considerados hostis (Iraque, Irã,
Cuba, Síria, Coreia do Norte e, mais recente-
mente, Rússia e China). Todas essas nações são
alvo de MCUs impostas pela Casa Branca.
Por ser uma política de Estado, a mudança
de governo, em 2021, com a posse do demo-
crata Joe Biden, não alterou o quadro. Logo
nos primeiros meses da administração Biden,
19 Justicativa pode ser acessada em https://
www.congress.gov/congressional-repor-
t/114th-congress/senate=-report290/1/?q-
%7B%22search%22%3A%5B%22H.+Rept%-
2C+114-290+-+DEPARTMENT+OF+STATE%2C+-
FOREIGN+OPERATIONS%22%5D%7D&s=4&r=5.
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o Secretário de Estado, Antony Blinken20 e o
assessor de segurança para o hemisfério oci-
dental, Juan González21, expressaram o com-
prometimento de aumentar a pressão sobre o
regime venezuelano. Sobre o primeiro ano do
atual governo Democrata e sua relação com a
Venezuela, analisou Romero (2022, p.4):
En principio, no se observa una diferencia
sustancial con respecto a lo hecho por el go-
bierno Trump: las relaciones diplomáticas
y consulares siguen rotas con el régimen de
Maduro, el gobierno de Biden ha reiterado su
apoyo y reconocimiento al gobierno paralelo
de Guaidó, enfatizando una salida política-e-
lectoral al caso venezolano y se mantienen las
sanciones a personeros y empresas del régi-
men y a sus asociados.
Assim, raticando o caráter transgoverna-
mental do embargo contra a economia vene-
zuelana, não houve exibilização das sanções
até maio de 2022, nem mesmo em meio as
consequências humanitárias da Pandemia de
Covid-19. Vale mencionar que todas as MCUs
contra a Venezuela foram decisões do Poder
Executivo, por meio do Departamento de Te-
souro, não sendo necessária, pois, autorização
legislativa para sua revogação. Isso reforça o
argumento do embargo não como uma po-
lítica de governo exclusiva de um partido ou
presidente, mas uma iniciativa de Estado, com
apoio de ambos os partidos no Legislativo.
Somente o advento da guerra na Ucrânia
foi capaz de mudar o cenário em favor da Ve-
nezuela. Em razão dos esforços dos EUA para
limitar as receitas da Rússia, em especial com o
estabelecimento do bloqueio ao petróleo russo,
se acelerou rapidamente a inação global. Para
20 Conforme informado em https://www.voanoticias.com/
investidura-presidencial-2021/nominado-secretario-esta-
doeeuu-seguira-reconociendo-guaido
21 Conforme noticiado em www.infobae.com/america/ve-
nezuela/2021/02/19/
mitigar os efeitos das MCUs contra a Rússia
para o sistema energético mundial, Washington
buscou a reaproximação com Caracas e, em 5
de março de 2022, autoridades do alto escalão
do governo Biden foram à Venezuela, abrindo,
pela primeira vez desde o início do bloqueio, um
canal direto de comunicação entre os dois países.
Inicialmente, houve pequenas concessões,
como as autorizações para exportação de petró-
leo em troca do pagamento de dívidas junto as
petroleiras Eni e Repsol22. Também foi permiti-
da a retomada das exportações de petróleo ve-
nezuelano pela Chevron, apesar da companhia
estadunidense continuar sem permissão para
ampliar as atividades em novos campos23.
Por ser bastante tímida, a exibilização ini-
cial não permitiu a Venezuela recuperar a pro-
dução petroleira aos níveis pré-crise. Sem novos
investimentos na exploração, o petróleo não
pode ser extraído do subsolo. Os anos de baixo
investimento deterioraram a infraestrutura e a
imigração de mão de obra qualicada continuou
a dicultar uma recuperação pujante. Também
por isso, a produção petroleira média venezue-
lana cresceu de 512 mil barris diários, em 2020,
ano com o pior resultado, para 761 mil no ba-
lanço do 3º trimestre de 2023. Ou seja, a produ-
ção alcançou apenas 31,1% da produção média
de 2015, quando foi de 2,365 milhões de bpd24.
Porém, em 18 de outubro de 2023, a e-
xibilização do embargo tornou-se substancial25.
22 Informação disponível em https://www.reuters.com/busi-
ness/energy/exclusive-us-let-eni-repsol-ship-venezuela-oil-
-europe-debt-sources-2022-06-05/.
23 Conforme noticiado em https://www.reuters.com/busi-
ness/energy/chevrons-output-gains-venezuela-limited-by-
-political-risk-ceo-says-2023-02-28/.
24 Conforme disponível em https://www.opec.org/opec_
web/en/data_graphs/335.htm.
25 Conforme noticiado em https://www.france24.com/
es/am%C3%A9rica-latina/20231019-estados-unidos-
-levanta-temporalmente-las-sanciones-sobre-el-petr%-
C3%B3leo-el-oro-y-el-gas-de-venezuela
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Licenças autorizaram, temporariamente, as
transações nanceiras e comerciais, bem como
investimentos nos setores de aviação, mineração
e exploração de ouro, petróleo e gás26. Por outro
lado, contas bancárias da PdVSA e do BCV no
exterior seguem bloqueadas, o governo segue
sem o controle da Citgo e joint ventures com em-
presas russas se mantiveram proibidas. Ao mes-
mo tempo, Washington condiciona as licenças
aos acordos políticos entre o governo Maduro e
o polo de oposição, tendo em vista os preparati-
vos para as eleições presidenciais de 2024.
Apesar de reconhecer que a proximidade
das eleições inuenciou na data escolhida para
a suspensão do bloqueio, a mudança na políti-
ca externa estadunidense não deve ser explicada
exclusivamente por tal fator. Resta claro que a
suspensão é resultado de um movimento inicia-
do em 5 de março de 2022, quando emissários
de Biden foram à Caracas sete dias após a Rússia
invadir a Ucrânia, acontecimento este de enorme
repercussão geopolítica que, em nosso entender,
fundamenta em importante medida a alteração
na política em relação à Venezuela. A referida
missão diplomática não foi antecedida por acor-
dos entre a oposição venezuelana e o governo
bolivariano, até porque as negociações estavam
há meses sem apresentar avanços. Tal argumen-
tação é fortalecido quando se menciona o fato de
que os aliados de Washington na Europa, pre-
judicados economicamente pela guerra na Ucrâ-
nia, pediram o retorno da Venezuela ao mercado
mundial de petróleo, conforme verbalizaram,
em junho de 2022, autoridades francesas27.
26 Documentos disponíveis em https://ofac.treasury.gov/
media/932226/download?inline; https://ofac.treasury.gov/
media/932231/download?inline; e https://ofac.treasury.
gov/media/932231/download?inline.
27 Conforme noticiado em https://www.reuters.com/busi-
ness/energy/france-wants-iran-venezuela-return-oil-mar-
kets-2022-06-27/.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo buscou afastar argumentos que
imputam aos insucessos, à corrupção e à inabi-
lidade política do governo conduzido por Ni-
colás Maduro como causas exclusivas da prin-
cipal crise econômica e social enfrentada pela
Venezuela em toda sua história.
Por sua vez, a argumentação aqui apresen-
tada trouxe elementos da história recente do país
caribenho que demostram a maneira pela qual
o embargo econômico imposto por Washington
asxiou o principal setor produtivo venezuelano.
Por ter uma economia rentista e extremamente
dependente da exportação de petróleo, a Vene-
zuela demostrou ser presa fácil para a consolida-
ção de uma estratégia de política externa agres-
siva por parte de Washington, consubstanciada
a partir de 2014, com ênfase entre 2017 e 2022
e que parece estar dando sinais de arrefecimen-
to neste exato momento, em especial por conta
das reverberações no sistema energético mundial
ocasionado pela Guerra na Ucrânia.
Importa salientar, por m, que as MCUs
tem sido frequentemente utilizadas pelos EUA
como mecanismos ecientes para promover o en-
forcement dos seus interesses no contexto das re-
lações internacionais. No que se refere às relações
interamericanas, o bloqueio econômico imposto
à Venezuela parece estar diretamente relacionado
ao aumento do protagonismo chinês no hemisfé-
rio, uma vez que Caracas despontou como um dos
principais atores regionais interessados em consoli-
dar a multipolaridade na América Latina e Caribe.
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CICERO, P. H. M. O rentismo petroleiro e seus impactos
para a política externa venezuelana (1927-2013). Tese (Dou-
torado em Ciência Política) - Instituto de Filosoa e Ciências
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