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estudos internacionais • Belo Horizonte, ISSN 2317-773X, v. 7, n. 1, (abr. 2019), p.25 - 40
Introdução
As guerras civis que levaram à derrocada de Muammar Gada, na
Líbia, e ao considerável deterioramento do governo de Bashar al-Assad,
na Síria, a partir de 2011, constituíram os mais drásticos cenários dentro
dos processos das denominadas revoltas árabes. As crises humanitárias,
corridas armamentistas e intervenções de forças estrangeiras, vinculadas
a esses conitos, iniciaram-se quando o Brasil ocupava uma vaga como
membro não permanente no Conselho de Segurança da Organização das
Nações Unidas (ONU). Frente a tais acontecimentos, a diplomacia brasi-
leira conseguiria se destacar promovendo leituras e propostas alternati-
vas às políticas das grandes potências para o Oriente Médio
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, buscando
consensos e ações conjuntas com países emergentes, como através do
grupo de países BRICS - Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - e os
países que compõem o fórum trilateral IBAS – Índia, Brasil e África do
Sul (VIOTTI, DUNLOP, FERNANDES, 2014).
Além de reetir uma ampliação de interesses e ambições no cená-
rio mundial, projetados a partir de Brasília, aqueles eventos foram esti-
mulados pelas transformações na economia política global e pela difusão
de poder na direção dos países emergentes, que beneciaram ao Brasil,
na primeira década do novo milênio. Com efeito, como assinalam Hirst,
Lima e Pinheiro (2010, p.22), essa combinação propiciou o desenho de
políticas assertivas, que vinculam posturas unilaterais do Brasil com po-
sições coordenadas com outros países em desenvolvimento em temas de
comércio, reforma nanceira, mudança climática, cooperação internacio-
nal, paz e segurança.
Cervo (2010) argumenta que uma das pretensões na denominada
política externa “ativa” e “altiva”, formulada durante o governo de Luís
Inácio ‘Lula’ Da Silva, foi o envolvimento do Brasil nas “estruturas he-
gemônicas” das grandes potências, como forma de fazer parte do jogo
das reciprocidades internacionais, bem como do comando e os benefícios
que dela se derivam. A teoria das “estruturas hegemônicas de poder” foi
desenvolvida em publicações do ex-secretário geral do Itamaraty, embai-
xador Samuel Pinheiro Guimarães (2005), quem teve inuência direta na
elaboração da “grande estratégia” internacional do governo de Lula.
Pode-se compreender a partir dessa “grande estratégia” a procura
brasileira por uma maior participação na agenda da segurança, prin-
cipalmente no âmbito da resolução de conitos e crises dentro do Sul
global (STUENKEL, 2013). O Brasil não cou alheio das questões de
segurança em regiões como o Oriente Médio, entendido como locus re-
levante de expressão do hard power das grandes potências internacio-
nais, as quais têm conservado uma índole de “cerco hegemônico” sobre
a governança dos principais conitos e ameaças dessa região, com capa-
cidade para exercer seus “bons ofícios” nos processos de paz, resoluções
e mediações dos conitos, com ou sem uso da força. Nesse contexto, a
“diplomacia presidencialista” de Lula também ofereceu seus “bons ofí-
cios” para uma mediação no conito palestino-israelense, no ano 2010; e
propôs um projeto junto com a Turquia, para buscar um acordo interna-
cional em torno do programa nuclear da República Islâmica do Irã, in-
2. Não existe consenso universal da deli-
mitação geográfica da região do Oriente
Médio. Para fins práticos e conceituais
do presente trabalho, emprega-se uma
noção ampla do Oriente Médio que cos-
tuma ser utilizada pela ONU. A mesma
reconhece como partes da região os se-
guintes países: Arábia Saudita, Bahrein,
Emirados Árabes Unidos, Iraque, Israel,
Jordânia, Kuwait, Líbano, Líbia, Omã,
Catar, Síria, Sudão, Iêmen, Palestina,
Turquia, Chipre, Egito e Irã.