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Ana Beatriz da Costa Mangueira, Andrea Maria Calazans Pacheco Pacico, Fábio Rodrigo Ferreira Nobre e Filipe Reis Melo O acolhimento dos refugiados
na União Europeia em virtude da securização da migração na região
utiliza-se o argumento de que os imigrantes, sem exceção de categoria,
ameaçam a estabilidade do Estado em seus diversos níveis (econômico,
social ou político) (BUZAN; WAVER; WILDE, 1998). Esse discurso pode
contribuir para a falta de responsabilidade com a proteção dos indivíduos
que solicitam refúgio. Segundo Giuliani (2012), na década de 1990, com o
processo de globalização, a Itália se viu em uma situação de emergência.
Isso aconteceu devido às mudanças no fenômeno das migrações, que, por
sua vez, desencadeou um aumento de 60% da população estrangeira da
Itália ainda nessa mesma década. Nesse contexto, as políticas de restrição
aos migrantes, incluindo os refugiados, foram intensicadas, dicultando
tanto o acesso quanto a permanência desses indivíduos na Europa.
Nesse cenário de globalização da década de 1990 e, com efeito, do
aumento dos uxos migratórios, os partidos políticos de direita
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em al-
guns países da União Europeia passaram a incorporar uma retórica que
disseminava o medo dos migrantes (GARCIA, 2014). Esses indivíduos
começaram a ser vistos como problemas que os Estados enfrentariam,
difundindo uma ideologia para a população de suposta ameaça. O caso
italiano sobre a temática serve de exemplo, uma vez que, na Itália, evi-
denciou-se que tanto os discursos proferidos pela mídia, quanto os discur-
sos de políticos se transformaram em medidas tomadas pelo governo a
m de securitizar a imigração local (VELASCO, 2014). Conforme Garcia
(2014, pp. 236-237), no caso da Itália,
[a] ótica securitária conjugada à retórica do perigo serviu para justicar a adoção
de medidas excepcionais que excedem o quadro jurídico regular, colocando a
emergência e a segurança nacional em um lugar de destaque na práticas governa-
mentais e estratégias midiáticas bem como na vida do cidadão comum e nas suas
relações com os estrangeiros. Se até os anos 1980 a convivência com os estran-
geiros era considerada pacíca ou isenta de violência simbólica e material, no
espaço de poucos anos essa postura dá lugar à hostilidade e a eventos cotidianos
de violência contra os imigrantes.
Com a hostilidade contra os migrantes, riscos são gerados aos re-
fugiados. Em certos casos, como em contextos de conitos e guerras nos
seus países de origem, esses indivíduos se sentem obrigados a sair em
busca de refúgio e possuem, como algumas das opções de destino, os
países da União Europeia (UE). Para Ferreira (2014, pp. 74-75), os países
desse Bloco sempre estiveram entre os principais destinos de migrantes
voluntários internacionais, contudo, segundo Fargues e Fandrich (2012),
os países europeus também sempre receberam de forma signicativa os
refugiados. Argumenta-se que, por esse motivo, foi criado o Sistema Du-
blin, qual seja, um regulamento da UE que estabelece os critérios para
os Estados-membros adotarem, dentro de sua responsabilidade, sobre os
pedidos de refúgio, tal como determinar o Estado-membro responsável
pela solicitação de refúgio (KASPAREK, 2016). Na maioria dos casos, esse
Estado é o primeiro local aonde os refugiados entram na UE, o que, para
os países que são porta de entrada da Europa, é visto como um problema.
Isso agrava a situação dos refugiados, já que muitos desses países, como
a Itália, utilizam a detenção de migrantes, incluindo refugiados, um dos
motivos para que o Sistema Dublin seja considerado falho.
Para Kasparek (2016), o Sistema Dublin tende a limitar o acesso
de refugiados, abandonando essas pessoas que precisam da proteção in-
5. De acordo com Wermuth (2014, p.
193), nesse momento “o que se observa
é que a migração se transforma em
bode expiatório da profunda crise
econômica em curso e grande trunfo dos
partidos de direita”, ou seja, as migra-
ções passam a ser parte dos discursos
políticos como um problema que precisa
ser solucionado, a fim de impedir que
as áreas econômicas e sociais da so-
ciedade europeia se desestruturem por
causa dos imigrantes. Alguns exemplos
de partidos “de extrema-direita, que nos
últimos anos têm usado o combate à
imigração como uma de suas principais
plataformas eleitorais” são o partido
neofacista Força Nova, Falange, na Es-
panha, e o Partido Nacional Democrata
alemão (VELASCO, 2014, p. 133).