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estudos internacionais • Belo Horizonte, ISSN 2317-773X, v. 8, n. 1, (abr. 2020), p. 107 - 124
Conselho de Segurança da ONU e a ajuda humanitária: aproximações
preliminares entre França e Alemanha
Devido a esse contexto, a pressão sobre Alemanha e França no que
cabe à responsabilidade de acolher os refugiados que chegam à Europa,
traduziu-se no fato de que são na conjuntura do equilíbrio de poder os
grandes players europeus, e necessitam atender as reivindicações impos-
tas pela sociedade internacional mais abrangente em função de manter
suas gestões fortes e legítimas.
Contudo, com vistas a compreender como ocorre a articulação
desses Estados perante a esse fato, devem ser levadas em consideração
não somente as semelhanças que elas apresentam entre si - como o nível
de desenvolvimento e aspectos culturais e econômicos - mas principal-
mente a diferença de se ter a França como membro permanente do Con-
selho de Segurança e a Alemanha
12
fora da condição tanto de membro
permanente quanto de membro não permanente do referido órgão no
período aqui recortado
13
.
O Conselho de Segurança é o órgão responsável pela manutenção
da paz e segurança internacional, formado por quinze membros: sendo
cinco permanentes, que possuem o direito a veto e são Estados Unidos,
Rússia, Reino Unido, França e China e dez membros não permanentes,
eleitos pela Assembleia Geral por dois anos. Esse órgão é o único da ONU
que possui poder decisório, ou seja, todos os membros das Nações Unidas
devem aceitar e cumprir as decisões do CS. Por esse motivo, o veto é visto
como uma regra que formaliza e explicita o GPM.
Partindo da estrutura desse órgão e de como se dá os seus mo-
vimentos, para se defender a hipótese de que a participação da França
como membro permanente interferiu em sua postura no tocante à crise
humanitária, foram analisadas todas as reuniões do CSONU dos anos
de 2015 e 2016
14
- anos em que a crise atingiu o seu ápice - dando ênfase
aos encontros em que se foi discutido como principal o tema das insta-
bilidades derivadas do uxo migratório na Europa. E no sentido de ter
uma compreensão mais harmonizada da percepção internacional frente
a esse dilema e de se ter mecanismos para comparar a postura dessas
duas grandes potências, averiguou-se além da posição francesa, a con-
duta da Alemanha e da União Europeia
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no mesmo espaço institucional
do Conselho de Segurança da ONU e, portanto, nas reuniões das quais
esses atores participaram.
Com isso, observa-se que mesmo com o agravamento dessa cri-
se, essa não foi uma das questões mais recorrentes nas reuniões durante
os dois anos
16
. Nota-se, então, que quando se discutem os conitos no
Oriente Médio, o foco recai para a tomada de decisões em relação às so-
luções que possam cessar os conitos em si, na proteção dos civis que
estão nesses países e no m das ameaças terroristas que estão fortemente
conectadas pelos atores com esses eventos. Dessa forma, o CS fez movi-
mentos mais preocupados com a segurança dos territórios conituosos e
12. Foi em 2012 que a Alemanha
cumpriu o seu último mandato como
membro não permanente do referido
órgão. Vale ressaltar ainda que o
Estado alemão é um dos principais
atores que reivindica uma restruturação
do Conselho para que novos Estados
possam ter a possibilidade de ocupar o
cargo de membro permanente. Para uma
cronologia completa da participação
alemã no CSONU, ver: https://www.
un.org/securitycouncil/search/country?-
field_member_state_value=DEU.
13. A partir desse contraste entre
Alemanha e França, levanta-se a
hipótese de se é esse o fator crucial
para se compreender o porquê de uma
distinção nas políticas de acolhimento
adotadas pelos dois Estados frente à
crise migratória atual.
14. No ano de 2015 foram realizados
241 encontros, sendo que 10 apresen-
taram a temática da crise migratória
como foco. Já em 2016, o número de
encontros total foi de 255, sendo que
somente 3 apresentaram a questão
migratória como foco. Assim, foram
objeto da análise do presente artigo os
registros de 13 encontros nos dois anos
aqui compreendidos. A documentação
pode ser acessada, por ano, em: http://
research.un.org/en/docs/sc/quick/mee-
tings/2016 e http://research.un.org/en/
docs/sc/quick/meetings/2015.
15. O objetivo aqui não compreendeu
analisar as soluções solidárias da UE e
sim entender como França e Alemanha,
os dois principais Estados desse arranjo
integrativo, buscam no GPM global
do CSONU atenuar os efeitos desse
episódio. Entretanto, vale indicar que
não se negligenciou a UE enquanto
global player. O fato de o artigo não
se debruçar sobre a UE enquanto
instituição secundária da sociedade
internacional não foi impeditivo para
vê-la e reconhecê-la como ator dessa
mesma sociedade. Representativo disso
foi destacar posições da UE no que
tange às reuniões aqui analisadas, cf.
nota de rodapé 13.
16. Pode-se afirmar que as questões
mais recorrentes nas reuniões durante
o período de 2015 e 2016 foram os con-
flitos nas regiões da África e do Oriente
Médio, as operações de peacebuilding
e peacekeeping, a não-proliferação de
armamento nuclear e o combate ao
terrorismo. Para maiores informações,
ver indicações na nota de rodapé 13.