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estudos internacionais • Belo Horizonte, ISSN 2317-773X, v. 10, n. 4, (nov. 2022), p. 7-22
Figura 1: Países com mais graduados em STEM
Fonte: Geromel (2019, p.244)
Apresentam-se, dessa maneira, variáveis comumente presentes no
olhar dos analistas estratégicos. Para Mahbubani (2021) isso induz a van-
tagens e falhas tanto no lado estadunidense como no lado chinês: se, por
um lado, nos EUA, está o maior potencial educacional, em que as insti-
tuições funcionam como caçadoras de talentos no mundo e incorporam
cidadãos de todos os países do planeta, por outro lado, na China, con-
quanto haja intenso crescimento econômico, renovada energia e impulso
dinâmico, o baixo potencial de atração e de retenção dos estrangeiros
talentosos prejudica a eciência das políticas implementadas.
Contudo, uma observação bastante signicativa pode ser extraída
dessas análises: a Ciência é um fator basilar na Geopolítica em sua face
multidimensional e polissêmica11. Dessa maneira, o cerne da disputa en-
volve não somente preparação, gestão, operabilidade e absorção de cére-
bros, mas também a consagração de um novo mindset capaz de redesenhar
os parâmetros por meio de uma nova lógica competitiva. Assim, de ma-
neira marcante, soam as palavras de Yan Xuetong no Webinar promovido
pelo Belfer Center for Science and International Aairs, da Universidade
de Harvard12, em que a rivalidade sino-americana na Era Digital abrange
uma China que compreende a importância do dinamismo econômico e a
relevância do impulso conferido pelo setor cientíco-tecnológico.
Nesse sentido, a disponibilidade de acesso a encontros acadêmicos
proporciona metodologias sob ângulo privilegiado. É notável, por meio de
análises netnográcas13, que as interações acadêmicas revelam dissonân-
cias subjetivas na maneira de pensar (CUNHA, 2020, p.192). Eventos, como
os que levam o selo das universidades de Harvard ou de Tsinghua, possi-
bilitam a vericação de subjetividades entre os que pesquisam o antago-
nismo sino-americano, reforçando o possível papel de Yan ou de Mearshei-
mer, como interlocutores, facilitando uma mediação entre mentalidades,
sobretudo na vertente acadêmica do diálogo estratégico14. Contudo, em
que medida essas relações, impulsionadas pela China, envolvem a América
Latina ou o Brasil? Embora com baixa capacidade de vericação empírica,
o deslocamento da competição para a vertente tecnológica tem potencial
para inuenciar as relações dos competidores com a América Latina.
11. Esse pensamento tem ganhado
expressão na comunidade acadêmica
brasileira. Conferindo destaque para a
máxima de Paulo Camara (2021), ao tecer
considerações sobre a relevância da ati-
vidade científica na Antártica e no Ártico,
o botânico sublinha a percepção de que
“a ciência é uma ferramenta geopolíti-
ca”: assim, o Minicurso Regiões Polares
e Relações Internacionais - ministrado
entre junho e julho de 2021, organizado
pelo Grupo de Pesquisa em Relações
Internacionais e Meio Ambiente (Gerima/
UFRGS) e pelo Earth System Governance
Brasília Research Center/ UnB - corrobo-
ra esse espírito. Disponível em https://
www.youtube.com/watch?v=z8Q6BofD-
sIY&t=986s. Acesso em 30/08/21.
12. O Webinar realizado em 9/10/2020,
sob o título “U.S.-China Bipolar Rivalry in
the Digital Age”, oferece chaves interpre-
tativas relevantes. Estudantes chineses em
Harvard e no MIT somam-se a outros deba-
tedores, dialogando com Yan sem des-
considerar as raízes acadêmicas dele na
Universidade da Califórnia, Berkeley, onde
obteve título de PhD. Entre as principais
assertivas apresentadas, considera que i) a
comparação do período atual com a Guerra
Fria é uma incongruência, ii) a competição
sino-americana, de maneira diferente
do que houve nas disputas travadas nos
últimos séculos, pode acontecer sem
conflitos militares, e iii) há possibilidade
de a tecnologia constituir uma referência
para o tipo de rivalidade nos dias de hoje.
Disponível em www.youtube.com/watch?-
v=CNDgCRt9BrY. Acesso em 11/08/21.
13. Para Tokarev (1989, p. 4), a etnogra-
fia, análise baseada em relatos subjeti-
vos, esteve, historicamente, associada à
segurança: envolvia conhecer os vizinhos
e dimensionar ameaças, avaliando o
comércio, a riqueza, a capacidade de
suprimento e o potencial de fazer guerra.
Hoje, segundo Cunha (2020, p.187), o
significado se renova, quando, “viajantes,
representantes de Estados, administra-
dores de empresas, pesquisadores ou
aventureiros expressam percepções,
a fim de informar, evitar surpresas,
anunciar descobertas”. Como recurso
metodológico, para Kozinets (2010), as
etnografias cibernéticas, as netnografias,
formam-se a partir de múltiplas camadas
de subjetividade no ambiente virtual,
expandindo a fronteira epistemológica.
14. O Professor Yan Xuetong atualmente é
diretor do Instituto de Estudos Internacio-
nais da Universidade de Tsinghua. A produ-
ção acadêmica dele simboliza uma possível
maneira de observar eventuais impasses
entre as mentalidades sino-americanas.
Outro evento que corrobora essa percepção
é o debate com John Mearsheimer, em 17
de outubro de 2019, no Carnegie-Tsinghua
Center for Global Policy, da Universidade de
Tsinghua, sob o título “Managing Sino-US
Strategic Competition”. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=O-
XEuK7hI0Cw. Acesso em 16/08/21.