Dossiê | Diferença e diferimento: Estudos sobre o presente

17-06-2024

Curadoria: Raffaele De Giorgi - Università del Salento (Italia), Giovanna Truda - Università degli studi di Salerno (Italia) e Juliana Neuenschwander de Magalhães – Universidade Federal do Rio de Janeiro (Brasil).

Talvez, mais do que nunca, o presente da sociedade moderna se apresenta como tempo da diferença e do diferir, da incerteza e do risco. As velhas formas de estabilidade, as delimitações estatais, as tecnologias de vigilância, as organizações dos sistemas sociais aparecem, ao mesmo tempo, redundantes e ineficazes, arcaicas e violentas: incapazes de vincular o tempo, de reduzir a incerteza do futuro, de estabilizar as expectativas de comportamento.

A semântica política e jurídica, que encontrou a sua legitimidade na ideia de autopreservação da razão, é incapaz de conter, apreender, qualificar conceitualmente o presente. As distinções conceptuais políticas e jurídicas modernas, com as suas instáveis determinações, estão expostas a contínuas ameaças e se revelam autodestrutivas. Diante da expansão do espaço da alteridade, as respostas ainda parecem ser em grande parte internas à lógica da antiga teologia política. De um lado, o estado, a soberania, a decisão, o estado de exceção; do outro, os direitos humanos, os valores, a singularidade dos indivíduos, como formas de recomposição de uma razão comum.

Contudo, o que nos parece caracterizar o tempo-espaço da sociedade do risco são as alteridades múltiplas e excedentes, resistentes e indisciplinadas ao léxico conceptual da teologia política. Diferenças que não se deixam dialetizar na lógica da identidade. A partir daqui derivam pelo menos duas ordens de problemas sobre os quais gostaríamos de refletir.

A primeira diz respeito à relação entre teoria e atualidade. A razão moderna, a razão iluminista, pensou esta relação em termos de crítica. A crítica teria permitido julgar o passado, através de uma antecipação do futuro no presente. Desse modo, a teoria, enquanto crítica, poderia descrever a si mesma como uma propedêutica, como uma premissa destinada a culminar numa indicação, numa práxis; o intelectual crítico poderia assim representar-se como supervisor do universal. Uma ficção que permitiria temporalizar a diferença, reduzir a complexidade e pensar o futuro como tempo e espaço do dever-ser. Uma ficção que poderia funcionar ocultando e mantendo latentes as condições do próprio observar. Agora, na contextualidade do acontecer da sociedade do mundo, uma vez que os pressupostos a partir dos quais a crítica pretendia falar a linguagem do universal se descobriram infundados e contingentes, acreditamos que é necessário um deslocamento de prospectiva, um trabalho sobre os limites e as margens, capaz de tematizar a auto implicação da teoria no próprio objeto.

A segunda ordem de problemas tem caráter operacional e diz respeito aos mecanismos com os quais, no presente, a diferença é construída, tratada, isolada e excluída. Ao nível da estrutura da sociedade, se estabilizam operações de contenção, resistência e bloqueio da complexidade. A complexidade é considerada uma ameaça. O excesso de possibilidades de ação é um excedente ameaçador. Estes excedentes devem ser controlados, pois constituem uma ameaça imanente e, portanto, estão colocados dentro dos limites do direito. Desta forma, a emergência estabiliza-se e a política e o direito transformam-se numa tecnologia de distribuição e gestão desigual de riscos, incorporando estruturas de seletividade de acesso e limitação do espaço de ação. E é precisamente sobre estes temas que gostaríamos de refletir e em particular sobre a relação central entre direito, política e alteridade. Como é que esta relação toma corpo quando as antigas formas de organização se desintegram? Quais os limites do direito diante da alteridade que ocupa o presente?

As submissões de artigos serão iniciadas no dia 20 de junho e encerradas no dia 15 de outubro de 2024. As diretrizes para autores devem ser observadas integralmente, conforme normas disponibilizadas no site da Revista da Faculdade Mineira de Direito.