Do isolamento compulsório da hanseníase ao desafio do não esquecimento
Resumo
No Brasil, em cumprimento à Lei Federal nº 610, de 1949, foi desenvolvida, até o ano de 1986, a política pública de saúde que promovia o isolamento compulsório e a separação de filhos das pessoas acometidas pela hanseníase. Para o cumprimento da referida medida, dezenas de instituições para isolamento de doentes e separação de seus filhos foram construídas pelo país, formando uma considerável rede de atendimento espalhada pelos estados brasileiros. Nessa época, o Estado tinha poder de polícia para criar mecanismos de intervenção e instituições, visando enclausurar e apartar os enfermos e seus filhos do convívio social, mesmo contra a vontade ou consentimento destes. Na atualidade é possível identificar dezenas de instituições espalhadas pelo território nacional e milhares de pessoas remanescentes da política pública de isolamento compulsório da hanseníase. Este artigo propõe discutir a importância desse patrimônio cultural da saúde. O texto que ora apresentamos é fruto de uma pesquisa realizada para a tese doutoral, defendida em 2022 no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUC Minas (FLORES, 2022). Seu objetivo foi analisar os efeitos psicossociais da separação dos pais acometidos pela hanseníase de seus filhos e os efeitos na construção social das identidades e nos modos de vida dos referidos descendentes. Mesmo com tamanha riqueza cultural e patrimonial, não existem no Brasil políticas públicas voltadas para a promoção e preservação das memórias sensíveis dessas minorias perseguidas.
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