UM TRABALHO IMPOSSÍVEL? Análise da atividade de psicólogos nas prisões
Palavras-chave:
Psicologia, Prisões, Clínicas do Trabalho, Direitos Humanos, ÉticaResumo
Discutir o trabalho de psicólogos nas prisões é abordar uma realidade historicamente marcada por dispositivos punitivos e de controle social, em um cenário de precariedade material, onde a violação de direitos humanos é uma constante. Isto posto, surge a necessidade de compreender a atividade desses profissionais, ainda pouco conhecida e discutida, não só pela sociedade, mas pela própria Psicologia, na medida em que se entende que os impactos causados por essa instituição afetam tanto as pessoas confinadas como todos os outros indivíduos, direta ou indiretamente vinculados a ela.
No contexto brasileiro, no qual as prisões são ocupadas predominantemente pela repressão e pela violência, Rodrigo Padrini Monteiro, com base em sua própria experiência profissional, buscou compreender, em sua tese de doutorado, a experiência e os sentidos atribuídos por psicólogos que atuam no sistema prisional à sua atividade. Partindo de uma perspectiva teórico-metodológica calcada na Psicologia do Trabalho, particularmente nas abordagens clínicas, o autor partiu da centralidade social e psíquica do trabalho para investigar as relações entre saúde e adoecimento, e os processos de subjetivação.
A tese defendida pelo autor, logo anunciada em sua introdução, é de que as exigências do trabalho real nas prisões e os obstáculos decorrentes dos atravessamentos institucionais colocam o psicólogo em uma situação de contradição, de sofrimento e de submissão à dinâmica da segurança e à lógica punição. Sendo assim, os profissionais são levados a não se apropriarem da sua prática de forma crítica, sendo conduzidos ao empobrecimento e à burocratização de sua atividade, além de naturalizar, de certa forma, violações de direitos dos presos e a deslegitimação de sua própria autonomia profissional.
A pesquisa de metodologia qualitativa, do tipo estudo de caso, envolveu 30 psicólogos que atuavam em prisões do estado de Minas Gerais, tendo sido realizadas observações in loco nas unidades prisionais, entrevistas individuais e grupos de discussão. Além disso, a investigação contou com dispositivos de análise documental e pesquisa bibliográfica para a elaboração das entrevistas, triangulação e categorização dos dados.
Para apresentar e discutir os resultados, o autor elaborou cinco categorias de análise, sendo estas: identidade profissional; trabalho sujo e sentido do trabalho; precarização e empobrecimento da atividade; naturalização de violações de direitos e da autonomia; e, por fim, resultados do trabalho, garantias e estratégias de resistência.
De modo geral, o pesquisador destaca os desafios enfrentados pelos psicólogos no ambiente prisional, incluindo a falta de formação adequada e a presença de uma identidade profissional frágil e frequentemente controversa, especialmente devido à escassez de um gênero profissional vivo, que ampare o indivíduo e possibilite novas formas de existir. Além disso, ressalta a visão negativa da sociedade quanto ao trabalho dos psicólogos nas prisões, visto como privilégio dos presos, em contraste com a percepção positiva dos profissionais, que se relaciona ao cuidado, por meio da garantia de direitos e assistência à saúde. Sinalizando os impactos institucionais que levam ao desgaste, o pesquisador explora um de seus argumentos centrais, analisando o aprisionamento, pelos trabalhadores, de suas formas de viver o trabalho, observando como eles podem internalizar práticas prejudiciais aos presos e a si próprios, devido à gestão autoritária ou como estratégia de sobrevivência, reproduzindo a lógica punitiva e violenta da instituição.
Concluindo, ao retomar o título da pesquisa, é possível constatar que, “se não impossível, o trabalho dos psicólogos nesse contexto é extremamente limitado, desvalorizado, rechaçado e impedido” (p.147). O autor indica que devemos considerar a complexidade da questão prisional ao pensarmos saídas possíveis para modificar esse cenário, colocando o coletivo como um elemento chave para se criar alternativas à realidade descrita. Por fim, o autor propõe a criação de espaços coletivos de discussão qualificada sobre a atividade, para promover a saúde dos psicólogos, fortalecer seu poder de agir e sua crítica sobre o trabalho, levantando, ainda, questionamentos para a Psicologia e suas práticas, em suas relações com o sistema de justiça e garantia dos direitos humanos.
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