DA MONOCULTURA À PLURICULTURA DO CONHECIMENTO:
ciência, saberes tradicionais e práticas integrativas e complementares na extensão universitária em saúde
DOI:
https://doi.org/10.5752/P.2594-5467.2024v8n17p433-455Palavras-chave:
Formação em Saúde, Extensão Universitária, Saberes TradicionaisResumo
A organização do sistema-mundo colonial estruturou-se sobre os pilares de uma racionalidade proto-científica nascente e que subjugava os conhecimentos não eurocêntricos. No que tange à medicina ocidental moderna ou biomedicina, esta desenvolveu-se de forma significativa a partir de finais do século XIX e atualmente encontra-se amplamente institucionalizada, apresentando-se como uma monocultura do conhecimento e responsável pela formação profissional e superior em saúde. Na universidade brasileira, a extensão caracteriza-se como um espaço formativo e de diálogo com a sociedade, com grande potencial de rever as hegemonias na produção do conhecimento e maior permeabilidade ao diálogo inter-epistêmico. A presente pesquisa teve como objetivo investigar a presença de atividades extensionistas cujas temáticas remetessem aos saberes tradicionais e às práticas integrativas e complementares em cursos de saúde da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Foi realizado um estudo de orientação qualitativo-exploratória e de base documental, a partir de bancos de dados de atividades extensionistas ofertadas pelas unidades universitárias de saúde da UFBA entre os anos de 2017 e 2021. Os resultados apontam para o predomínio da monocultura do paradigma biomédico no contexto extensionista da formação em saúde, sobretudo no que tange aos saberes tradicionais brasileiros. Compreendemos que agregar à formação uma perspectiva pluriepistêmica significa uma escolha ativa por alargar o conceito de ciência na contemporaneidade e que a extensão universitária deve ser o espaço privilegiado para estas ações, considerando-se o seu potencial de diálogo e aprendizado mútuos com a sociedade em sua diversidade.
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